Disfarçando ignorância com comédia

 

Quando o homem situa-se na linearidade histórica a cronologia acaba empurrando-o à aceitação de que o homem atual é sempre superior e mais evoluído que o antigo. A idéia de que tudo evolui é de bom grado ao homem. Há 2.500 anos, na Grécia Antiga, Heráclito dizia que as risadas tinham o poder de neutralizar os problemas da sociedade. Guerras e vícios poderiam ser esquecidos com boas gargalhadas. Naturalmente que a filosofia grega tinha uma função maior do que apenas racionalizar; objetivava mudança. Eles não diziam o que diziam apenas por dizer, mas para que algo mudasse. Passados 2.500 anos convivemos com a mesma situação: quando a pessoa não sabe o que dizer sobre determinado assunto, ela faz piadas, ri, debocha. O homem em seu Ego não suporta a idéia de que o mundo funcione sem ele. Ver que o mundo pode girar sem ele, que as pessoas podem conversar sem que ele se manifeste, causa transtorno tamanho que não sendo possível participar positivamente do debate, somando idéias, opta-se pelo caminho inverso: a destruição da discussão através do desfoque por piadas, comédias e risadas.

Uma frase que com certeza mudaria o mundo é “Eu não sei”. Imaginem como o mundo seria um lugar melhor se as pessoas tivessem a coragem de dizer “Eu não sei”. O homem que ao invés de dizer que sabe o que não sabe, e estaciona em conhecimento, diz que não sabe e vai atrás para saber. A pessoa que quando não sabe nada sobre o assunto discutido, quando não tem o que falar, não suportando a idéia de que o grupo continue o debate sem a presença dela, usa-se da comédia, das piadas, das risadas, numa tentativa desesperada de desfocar o assunto. Diz-se que conhecimento é poder; e isto não é dito à toa. O homem como lobo do homem busca o poder, e o homem ignorante não tem poder, não tem as rédeas da situação. Ele vê o grupo debatendo, conversando, e ele se sente impotente, pois sua própria ignorância lhe causou esta impotência. Busca aceitação e não se vê incluído, pois o assunto transcedeu seu limitado estado de consciência, então é preciso trazer de volta para o seu potencial, fazendo com que deixe-se de debater a idéia para voltar ao estado charcoso e pútrido da frigidez de idéias. Trata então de reverter a situação, incapacitado de criar e somar, tenta destruir o debate.

Surge então a tentativa falaciosa de justificar tal conduta com: “rir é bom”, “pessoas que não riem são infelizes”, “quem ri muito é feliz”; tentam justificar sua ignorância com a estigmatização que a sociedade dá de pessoas felizes; como que se a felicidade fosse necessariamente, tão e somente, rir de tudo o tempo todo; e isto lhe serve como boa justificativa. “Eu rio de tudo, pois eu sou uma pessoa feliz; você não ri, você é infeliz”. Obviamente que a ignorância vai tentar ser justificada de alguma forma, e o apelo emocional e falacioso é o que mais serve à plebe de intelecto; pois é muito mais prático e fácil evocar eternas piadas genéricas do que ir conhecer sobre o assunto debatido. Desconhecem, entretanto, que a grande maioria dos filósofos gregos não sorriam, assim como os modernos. Na escola de Pitágoras, o neófito deveria ficar 3 anos sem pronunciar uma só palavra, e a menos que tal recinto vivesse em risos através de mímicas e pegadinhas de pessoas escorregando em cascas de bananas e levando sustos com pessoas saindo de lixeiros, natural presumir que a sabedoria anda mais de mãos dadas com a sensatez do que com o desespero, pois, como já disseram: “rir de tudo é desespero”.

Ao que não tem o que somar em um debate, há de se esperar que tente transmutar tudo em risos, piadas, comédias e risadas. A conduta é presumível e não há de se esperar coisa diferente. Cada um dá o que tem. Quem não tem idéia para dar, não dá. O que há de se fazer é que aquele que tem algo a somar não se deixe levar pela necessidade de tornar-se igual ao povo, deixando de debater e compor idéias para fartar-se em gargalhadas; pois isto nada lhe somará em sua vida. Não deve-se nunca ter desprezo ou repúdio para com aqueles que sendo ignorantes no tema tentam destrui-lo e desfocá-lo com piadas e risadas. Estes não sabem o que fazem e a piedade e compaixão merecem. O sábio há de amar as idéias e o mundo das idéias com tanto ardor que tornar-se-á cego à profanação da discussão pela ignorância que tenta debilitar intelectualmente o seu tesouro. Seu coração amará tanto Sophia, que só terá olhos para tão e somente ela e todas as tentações do mundo lhe passarão desapercebidas pois só terá olhos para o seu grande amor: a sabedoria.

 

12 comentários sobre “Disfarçando ignorância com comédia

  1. lualfa disse:

    Ola! Rudy
    O riso é uma descarga de tensão emocional que muitas vezes é liberada em momentos de ansiedade, opressão, pressão psico-emocional. Assim como o choro, pode acontecer quando estamos felizes ou somos surpreendidos em uma situaçãode natural espontaneidade nos assustamos logo depois, caimos na gargalhada e choramos “com a dor na barriga”. As crianças gozam muito nas brincadeiras de esconde esconde quando são surpreendidos. O riso de prazer ou gozo, assim como o choro são emoções liberadas nas mais variadas e inusitadas situações.
    Aqui você citou uma delas, a situação da liberação da tensão emocional sob a forma de ironia, deboche que muitas vezes chamamos de senso de humor que acontece diante de discursos muito densos, cansativos e profundos que exigem a concentração da atenção e que dizer uma bobagem ou soltar uma piada mudando e ‘quebrabrando” o clima faz muito bem porque alivia a tensão acumulada da atenção concentrada que pode ser exaustiva prejudicando a assimilação e entendimento do discurso que fica enfadonho, cansativo e até pode dar sono.
    Existe a terapia do riso que proporciona a sensação prazerosa de leveza e bem estar com a liberação da carga emotiva no estado de relaxamento.
    Se a pessoa ri muito é porque está muito receptiva e sensível aos estímulos sensórios. Se a pessoa é calada e não expressa suas emoções numa risada ou gargalhada gostosa e não se deixa contagiar pelo riso, é porque pode estar bloqueada ou desviando sua atenção e concentrada em outras coisas ou está em sua viagem “interna”, na sua subjetividade…”matutando algo” em seu silêncio interior, meditando ou muito preocupada com algo importante e não se permite areceptividade e troca emotiva, reprimindo ou bloqueando a stuação. Está distraída e desatenta.
    Sabemos o quanto é bom estarmos receptivos e abertos para as trocas afetivas com as pessoas que nos cercam, mas nem sempre permitimos.
    Na Índia as pessoas se reunem numa praça para rir e gargalhar, muitas pessoas conseguem se contagiar com aquela emoção saindo dali leves, relaxadas e com aquele semblante sereno e feliz… Rir é liberar emoção. É a expressão do prazer, gozo, alegria muito diferente da dor que contrai e prende, “expreme” e a água sai na forma de lágrimas, choro.
    E muitas vezes choramos de prazer e rimos na dor .
    Enfim, somos paradoxais, contraditórios e doidos mesmo!!!
    ADOREI O TEXTO, BEIJOS

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  2. Tony disse:

    O texto, apesar de bem estruturado, demonstra claramente que o argumentador possui um recentimento pessoal em relação aos “fazedores de piada”. Imaginei detalhadamente à cena de um intelectual tentando ser o centro das atenções com um assunto que ele julga ser interessante, daí o mais descontraído da turma, notando o tédio dos demais, solta aquela piada que desarma à todos e desenfoca somente quem tinha maior interesse no assunto: o intelectual egocêntrico. O piadista então torna-se temporariamente o centro das atenções, motivando à todos com uma simples frase, proeza que o intelectual não conseguiu após um longo discurso. O intelectual então, sem saber como reagir no instante, vai para casa e utiliza-se de todo seu vocabulário para desabafar na internet. Coerente não é mesmo? Mas não quer dizer que seja verdade. ;)

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    1. Tony disse:

      Que legal, você fez uma piadinha. rsrs =D
      Acredito que a maioria daquilo que não aprovo não está diretamente relacionado a um “recentimento pessoal”. Estorvo do tema em detabe. Ah! Eu também sempre quis ser padeiro, é frustrante não conseguir.
      Parabéns pelo blog, muito sedutor.

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  3. André Oliveira disse:

    Cientistas comprovaram que macacos exibiam os dentes em sinal de submissão a seus superiores ou lideres…
    Não podemos julgar, mas devemos expor nosso ponto de vista quanto a frase de Heráclito “Risadas tem o poder de neutralizar os problemas da sociedade”. Ele não generalizou o humor espontâneo e até mesmo instintivo humano. A uma necessidade humana de sentir prazer naquilo em que se trabalha. É uma forma de recompensar o sacrifício, não quero expor uma idéia hedonista, apenas quero demonstrar que isto está ligado a natureza humana. Quem nunca ouviu uma piada enquanto bebia um liquido? Perceberam a força do riso… Ele chega a ser incontrolável.
    Sorrir é uma forma de relaxar o alto índice de estresse; é como chorar. Não podemos ceifar isso… O sorriso é o escopo do humor.

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  4. Think It disse:

    Meninas,

    Se eu entendi bem, ele mostra também que os sábios de outrora tinham sim senso de humor, na parte que ele descreve o neófito e sua “clausura” da palavra por 3 anos na Escola de Pitágoras.

    Ele quis mostrar que quando se está “investigando” algo, não é momento para brincadeiras, como vocês entenderam. Momentos de brincadeiras é quando todos estão se divertindo, não investigando !!!

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  5. Moriah disse:

    Pois é! Eu também discordo da imagem dos sábios sisudos. Na verdade, muitos deles tinham um interessantíssimo senso de humor. E eu também só acredito em aprendizado com leveza e alegria. É a maneira mais eficiente de ensinar. :)

    Amei o seu blog, BTW! Parabéns! Muito lúdico! Hahahahahaha!

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