Resposta em pergunta para entrevista de emprego

 

Há um tempo atrás fiz uma pré-entrevista para uma vaga de advogado em um escritório aqui da região. A 1ª etapa era responder um questionário. Os que passassem seriam chamados para uma 2ª etapa, a entrevista. Aí está uma das questões que surgiu no questionário e a resposta que eu dei.

10- O que pensa sobre a situação econômica do país e a crise mundial?
R.: Vários fatores implicam para a crise mundial. Uma delas é o instinto de competição entre as pessoas. Tudo é competição, todos querem ser melhores que os outros e isto acaba criando uma tensão de própria existência. Este espírito de competição (em ser o melhor, o mais reconhecido e o mais bem sucedido), faz com que as pessoas deixem de se ver como irmãos (pois todos fazemos parte de um todo) e passem a ver o próximo como um adversário. Os judeus costumam dizer: “o que é ruim para o meu vizinho, é ruim para mim” e isto não existe na população. Ao ver algo ruim acontecer todos pensam: “não é comigo, então está bem”. Se passássemos a nos ver como parte de integrante de uma unidade onde fazer o mal a alguém é dar um tiro no próprio pé já mudaria algo.

Outro ponto é o próprio consumismo desenfreado. Todos se perdem em seus próprios desejos. Querem ter coisas de que não precisam e isso gera a ambição e a ambição gera a ganância e arrogância. Se a pessoa tem um carro para se locomover ela irá querer um outro carro melhor. Então, irá fazer um empréstimo com o banco e passar 60 meses da sua vida preocupada em pagar a prestação do carro no fim do mês e se não trocar de veículo enquanto está pagando trocará no final. Para a pessoa não basta ter um terno para poder trabalhar tem que ter o melhor terno. Não basta ter um carro para se locomover tem que ter o melhor carro e é neste ponto que quanto mais se deseja mais se deixa de fazer pelo próximo. A pessoa precisa de um terno mas não basta ter um terno precisa ter o terno mais caro. A pessoa tem uma televisão em casa mas se lançam um televisão com 0,5 polegada a mais ela precisará comprar a nova televisão; se lançam uma televisão que mudou a cor do botão do controle remoto terá que comprar a nova tv. Busca-se o tempo todo por aquilo que não precisamos. Schopenhauer dizia: “queremos não por que tenhamos razão para querer, mas criamos razões porque queremos”. Se o homem passasse a querer ter somente o que realmente precisa para viver o mundo já mudaria bastante.

O mal do século é a solidão. As pessoas têm medo de não serem aceitas e fazem o que for preciso para ser aceitas e o mercado consumista dá essa falsa idéia de que comprando o que está na moda e comprando o que está em evidência você será aceito. Então, passa-se a desejar aquilo que não é preciso. As pessoas compram o que não é preciso simplesmente para preencher um vazio que há dentro de si e para serem aceitas; porém, isto não é difícil de perceber. Nossa sociedade valora as pessoas pelo que elas têm e não pelo que elas são. Nisto, na necessidade da pessoa em ser aceita (justamente porque não se conhece, as pessoas não sabem quem verdadeiramente são) ela busca ter o melhor carro, o melhor terno, o melhor relógio, jóias, num eterno ciclo de consumismo. Napoleão dizia que “o maior orador do mundo é o sucesso”. O sucesso fala pela pessoa bem sucedida, mas o que é o sucesso? Ter ou ser? Em nosso mundo atual não há dúvidas é que o ter e isso é uma demonstração de como há uma falha atual no sistema de nosso planeta.

O sistema econômico e financeiro mundial também é diretamente responsável pela crise que assola o planeta. 90% da riqueza mundial está concentrada nas mãos de 10% da população e a forma que encontraram para concretizar isso foi a globalização. Em 1.911, John Rockefeller (dono da maior empresa de petróleo do mundo na época (Standard Oil Company, que controlava 90% de toda a produção de petróleo e derivados)) tinha uma fortuna de US$ 3 trilhões, o que não é difícil de imaginar que se uns têm demais outros têm de menos. O poder que é dado às instituições financeiras privadas que especulam o tempo todo através de seus contatos com a mídia criando crises e mais crises e gerando dívidas e mais dívidas.

A especulação gera a crise, a crise gera a dívida e a dívida cria escravos. A crise americana de 1.929 nada mais foi que uma jogada para grupos de banqueiros internacionais comprarem bancos privados a preço de saldo como também compraram empresas por preços ínfimos; pois já haviam criado a dívida anteriormente. O sistema financeiro, o dinheiro, nada disto é real, as pessoas são reais. Todo dinheiro gerado para saldar dívidas de empréstimos já é fabricado com mais uma parcela de juros o que cria um ciclo sem fim de poder para poucos pois de onde vem o dinheiro utilizado para pagar o empréstimo? Do próprio banco.

A globalização fez com que acabasse a classe-média dividindo a sociedade em duas castas: os ricos e os pobres. Todas as revoluções que mudaram o mundo foram feitas pela classe-média. Os pobres não tem dinheiro para fazer uma revolução, precisam trabalhar, estudar e não tem tempo para pensar e os ricos estão bem como estão, não precisam que nada mude. Os ricos cada vez mais ricos e os pobres cada vez mais pobres. Estão dividindo a sociedade em castas para que nada mude e o sistema religioso também ajuda no ponto que fez com que o homem esquecesse de sua união com o todo cósmico.

Nascemos em um mundo já pensado onde basta seguir o que nos foi ensinado: “Você deve estudar, para ter um bom emprego, para ter dinheiro para se sustentar, formar uma família, ter filhos, se aposentar, se aposentar, ter uma boa velhice e poder aguardar a morte com dignidade”; mas este sistema já não está fazendo mais efeito. As pessoas buscam algo a mais.

Para sair da crise primeiramente é necessário reconhecer que há a crise, depois será necessário que haja o despertar de um sentimento de mudança e se tornará indispensável que queira-se sair desta crise. Então, analisando o todo, veremos que o que é ruim para um é ruim para todos e que todos estamos interligados onde a ação de cada um ecoa na sociedade toda. Precisaremos então adquirir a consciência de que todos precisamos de todos pois a engrenagem precisa desde o parafuso mais pequeno até a prensa mais forte e nisso, sabendo que um precisa do outro, não haverá mais concorrência, disputa, competição; pois poderemos descobrir dentro de nós mesmos o que é essencial. Nisto, teremos o conhecimento de que nada é por acaso e que tudo decorre de uma ação anterior e cada um tentará descobrir a sua função na engrenagem e passaremos ao invés de tirar um do outro, doar, e esse grande esforço por um bem-comum elevará à humanidade a um nível jamais visto, uma grande fraternidade.

Eu não consegui a vaga mesmo tendo curriculum para tal. Talvez eu não tenha dito o que eles esperavam ouvir; porém, eu simplesmente não consigo deixar de pensar isso sobre este assunto e não conseguiria dizer e expressar algo que eu não sinto. Iria dizer o que? Falar em macro e microeconomia? Falar da carga tributária? Falar da oscilação de investimento de capital privado? Será que aí que está o problema ou na falta de unidade em nosso planeta?

Muita gente pensa em mudar o mundo. Querem fazer grandes revoluções, anarquias e rebeliões e concentram seus pensamentos em grandes coisas mas não agem nas pequenas. Dançam conforme a música que lhes tocam. Falam, pensam, vestem e agem como querem que façam e a mudança não passa de papos de bar e filosofias que sem ações se tornam vãs. As mesmas ações produzem as mesmas reações. O mundo como uma grande reação só irá mudar quando as ações mudarem. Você tem que viver o que você acredita.

 

17 comentários sobre “Resposta em pergunta para entrevista de emprego

  1. Alexandre disse:

    Minha resposta é para a Ana Paula Leite Evangelista, aí em cima.

    Ana, ele já fez a parte dele jogando na cara do empregador o que ele pensa. Ele não se vendeu e quando todas as pessoas do mundo decidirem não se vender mais, o mundo vai mudar, pode ter certeza. A parte dele foi feita. E além disso, ele publicou o pensamento dele no blog, o que pode inspirar outras pessoas.

    Quer saber de uma coisa? Com o advento da internet, a próxima revolução da classe média já está em estágio embrionário.

    Curtir

  2. Moriah disse:

    Vc é muito figura, Rudy!

    Certamente eles não querem nem saber de ter pessoas que questionam nas empresas. A gente vai encher o saco, sabe?

    Eu também nunca passo em entrevistas. Nunca mesmo. Por isso eu sou freelancer a vida toda. Vc vai ter que abrir seu próprio escritório, ou ir trabalhar no de um amigo que tenha a mesma afinidade de coração.

    Achei muito fofa a sua carta.

    Beijos!

    Curtir

  3. Eric disse:

    Empresas são um nojo. Você tem que fingir ser quem eles precisam contratar. Mas gostei do que você fez… não era o que eles queriam ouvir, mas era o que você queria dizer.

    Parabéns pelas ótimas postagens.

    Um abraço e muita paz.

    Curtir

  4. Arádia Marques disse:

    “Este espírito de competição (…), faz com que as pessoas deixem de se ver como irmãos (…) e passem a ver o próximo como um adversário. ”

    “Se o homem passasse a querer ter somente o que realmente precisa para viver o mundo já mudaria bastante.”

    “Nossa sociedade valora as pessoas pelo que elas têm e não pelo que elas são.”

    “A especulação gera a crise, a crise gera a dívida e a dívida cria escravos.”

    Essas foram apenas algumas das frases com as quais mais me identifiquei, porque na verdade, me identifiquei com quase tudo.
    Eu vivo essa filosofia de querer o necessário, fazer minha parte e não competir – aliás, abomino qualquer tipo de competitividade. Pessoas e empresas que expoem o ser humano a este tipo de situação, são igualmente abomináveis.

    Mais uma vez, parabéns por este texto. Foi por causa dele que fiquei sua amiga =)
    Um beijo,
    Arádia Marques.

    Curtir

  5. LualfaVênus disse:

    Olá Rudy
    No texto você abordou a realidade sócio-econômica do país em que vive, de modo objetivo. Neste meio capitalista em crise, a competição que é uma característica nata dos humanos, indica as diretrizes do sucesso. A classe média é sinônimo de “mediocridade” . A mola mestra é a manobra das massas que dá e visa lucro. Rudy, no momento de avaliar a sua resposta, talvez não estava presente o “espírito”idealista e fraternalmente humanitário que une as pessoas num progresso benéfico, que você inspira, mas sim o capitalismo selvagem e a corrida para a aquisição do lucro abusivo, infelizmente.
    Valeu
    Novas oportunidades surgem, fique atento
    BJXXXXXXXXXX

    Curtir

  6. Mariana disse:

    Olá, tudo bem? Eu sou aquela menina que começou aquele assunto de Sociedades secretas no orkut, na comunidade do the secret.

    Então, muito legal te entendi perfeitamente e aí te pergunto, tem certeza que sua realização profissional está na advocacia? Eu digo isso pq penso que é óbvio que pra vc conseguir emprego na área de advocacia em uma empresa, vc tem que ser muito mais racional que emotivo, tem que ser muito mais obstinado e dissimulado de certa forma.

    Na verdade vc tem uma racionalidade, mas é baseada em uma emoção, a de que o mundo está uma merda. Acho que uma empresa que quer contratar um advogado não quer alguém que pense assim… Como vc vai defender algo que ta errado pensando assim? Pq creio q advogados, em certos momentos, tem que esquecer a ética… Se não, estupradores, bandidos, traficantes e as grandes empresas(que creio que é o que dá a maior grana pra empresas de advocacia) ficariam sem defesa…

    Sei lá, acho direito algo muito legal e interessante, mas não me imaginaria advogada pensando que poderia estar sendo injusta em algum momento… Creio que vc tb tem senso de justiça tb, então imagino que sendo advogado , possa se encontrar em um atordoamento mental, já que presa pela justiça e nem sempre poderá estar defendendo o que está correto…

    Curtir

  7. Roger Rodrigues disse:

    Como alguém que não fez Direito e se interessa muito por Sociologia, vou dizer que há fios faltando aí: a classe média ainda existe e é a atual classe calada (representada no ambiente empresarial pela gerência – que não luta por melhores condições para seus funcionários). A globalização serviu bem pra esconder a classe pobre (ela está sempre distante na TV). Revoluções que mudaram o mundo podem ter sido lideradas por burgueses, maçons, homens de letra ou classe média – chame do que quiser -, mas não se esqueça da “massa de manobra” que nem pelo comunismo não foi beneficiada.
    O que, particularmente, vejo aqui nos Estados Unidos (onde a meta e não o problema é a solidão) é uma busca desenfreada por conforto (e não por status, acredite!). O que me lembro bem do Brasil é que ninguém – inclusive eu e você – sabe como mudar a condição miserável em que nos encontramos como povo e, de acordo com nossos credos, cada um se agarra a uma pretensa forma de melhorar o mundo (seja isso ONG, religião, Ordem, caridade, etc.).
    Dizer que o Brasil precisa de uma nova constituição ou de novos políticos inspirados ou de democracia (nunca tivemos) é dizer o óbvio. Como diz-se aqui: you talk the talk but d’you walk the walk? Não há rosacruz ou espiritismo que faça acontecer, meu amigo.
    If I had to talk the talk, iria dizer que precisamos retomar A República de Platão e começar de novo. But I don’t know how to walk the walk e eu podia dar diversas desculpas pra isso, como todo mundo faz.

    Se a pessoa que corrigiu sua prova fosse te ligar pra replicar sua resposta, ela diria: todo mundo reconhece no Brasil a crise, mas como se desperta o sentimento de mudança? Como se deseja sair de uma crise onde você e eu temos computador, televisão e comida todo dia (além de balada toda sexta pra quem gosta)? Que todo é esse tão ruim pra todo mundo se eu não estou sentindo dor ou você foi atingido pela chuva? Pra descobrir dentro de nós o que é essencial, temos que “voltar ao tacape”, como diz Millôr.

    Eu diria que seu último paragráfo do post perde em precisão porque todo dia tem gente executando alguma ação na esperança de melhorar o mundo, gente que vive o que acredita e faz acontecer. Mas nem esses nobres espíritos têm a palavra de poder. Quando você quiser passar numa entrevista, diga que se lamenta pela crise e que acredita que podemos superá-la com trabalho conjunto.

    Aiai! Falei demais. I’m sorry, bud. :(

    Curtir

  8. Rama disse:

    Eu gostei bastante do texto e antes de chegar ao final já imaginava o resultado da entrevista ahahahah. Você pontuou várias coisas interessantes, mas a que eu mais gostei, sem dúvida, foi a menção de q todas as revolução são feitas pelas classes médias. Muito preciso.

    Abraços

    Curtir

  9. Vitor Odenor Aquino da Silva disse:

    Gostei do artigo sendo que o último parágrafo arrebentou.

    “Você tem que viver o que você acredita.”… Cara quem consegue chegar nesse nível de auto-conhecimento com certeza é feliz.

    Obrigado pela sabedoria…
    Grande Abraço.

    Curtir

  10. Luciano disse:

    Preciso seu texto Rudy, realmente, é isso mesmo que acontece ou acompanhamos o que nós é passado pela mídia ou ficamos fora, querem embotar aqueles que como você “pensam”, querem tirar de nós está faculdade dada por Deus, querem nos brutalizar, mas enquanto existir pessoas como você que de uma forma ou de outra influência de uma forma positiva os leitores do seu “blog”, creio que pelo menos não seremos manobrados tão facilmente por esse mundo globalizado.

    Curtir

  11. Cavaleiro_Andante disse:

    Oi pessoal, esta matéria está ótima, mas caso vc Rudy queira um emprego é necessário mostrar um pouco de ambição, as empresas querem pessoas com sonhos e metas a conquistar e na visão dos empresários um clima de competição é muito bom para eles, pq eles sempre terão funcionários querendo um ser melhor que os outros. Mas de qualquer formas nascemos neste mundo competitivo.

    Curtir

  12. Marcone disse:

    Olá Rudy,

    Realmente esta não era a resposta que eles queriam. Sou advogado e sei como são essas entrevistas. Muito bom post mesmo. Em relação ao consumismo e a “desunião”, foi perfeito. Eu sinto isso na pele: tenho um carro ano 2001 (Seat Cordoba), este é perfeito para minhas necessidades, só gasto com manutenção e não tenho prestações a pagar, porém a pressão para que eu troque por outro mais novo é enorme, inclusive de familiares…Eu fico refletindo quela seria o motivo real para eu ter um carro do ano. É o status meu caro, é o status. Ainda bem que estou praticamente vacinado quanto a isso e vou seguindo com meu “companheiro” motorizado sem problemas.

    Usei esse exemplo para ilustrar como superficial é a sociadade hodierna. Capenga, sem visão e fadada ao fracasso.

    Abraços.

    Marcone Mendes.

    Curtir

Deixe um comentário